
Eu não sou
Estou sendo. Gerúndio, mesmo.
Ninguém é. Estamos sendo. Gerúndio, mesmo.
Estou sendo de tudo um pouco; de todos um pouco.
Estou sendo o que não gosto em mim e o que gosto.
Vivo minhas contradições, minhas ambivalências. Não pode haver certezas e coerências. A coerência seria a minha desgraça!
Estou sendo meus desejos íntimos; desejos são sagrados, sigilosos e secretos. Estou sendo, na minha clandestinidade; ela foi a minha salvação e a minha condenação. Foi o meu triunfo e minha intriga.
Descubro-me novo e de novo a cada dia. Hesito, não sei no que vai dar. Às vezes, torna-se necessário acelerar no escuro e confiar. Confiar em quem? Na vida. Ela vai, aos poucos, mostrando-se a mim; eu vou me mostrando a mim mesmo a cada dia… um novo ser. Dessemelhante, desigual. É como se me enfiasse a mão e me puxasse pelo avesso. O avesso de mim e de minha verdade. Verdade? Não há. Não a tenho. Sou uma mentira e uma verdade. Sou as minhas verdades e as minhas mentiras.
Fazer o quê? Ambivalências, pois sim.
Eu vou indo… nada de parar… não há tempo de pensar. Tampouco de parar.
Não posso ser o que eu quereria ser. Quereria? Sim, futuro de pretérito. Sim, eu sou o passado e o futuro, juntos.
Simplesmente sou indo, estou indo. Até sempre.
***Paulo Afonso Caruso Ronca, Professor Doutor em Psicologia Educacional – UNICAMP e Psicanalista – IPLA. Há 50 anos é diretor do Instituto Esplan, onde, com uma equipe multidisciplinar, atende crianças, jovens e adultos que necessitem de uma atenção especial e individual no que diz respeito ao processo de desenvolvimento cognitivo, emocional e social***